terça-feira, 23 de março de 2010

TEXTO 01 2º ANO (UMA APROXIMAÇÃO CONCEITUAL DO CONHECIMENTO

Uma aproximação conceitual do conhecimento


A pergunta para a qual vamos tentar dar uma resposta é: o que é o conhecimento?

     Toda vez que perguntamos a alguém o que ele entende por conhecimento, a primeira resposta que normalmente recebemos é a seguinte: “conhecimento é aquilo que aprendemos nos livros”; ou então: “conhecimento é aquilo que aprendemos com nossos professores, com nossos pais”.

     De fato, essa resposta não está de todo inadequada, pois que, certamente, adquirimos conhecimentos com nossos professores e nos livros que lemos e estudamos. Contudo, ela é insatisfatória na medida em que nos diz de onde adquirimos conhecimento, mas não informa sobre o que é conhecimento. Para encontrarmos uma resposta para a pergunta que colocamos, temos de dar atenção ao segundo aspecto e não ao primeiro, ou seja, o que é e não onde adquirimos o conhecimento.

    Assim sendo, a questão formulada está a merecer uma resposta. Há que se buscar uma resposta que esclareça o sentido essencial do conhecimento.

    Por vezes, ouvimos dizer que o conhecimento é a elucidação da realidade. Essa afirmação parece ser correta, pois, ainda que de forma sintética, expressa o sentido correto do conhecimento. Vamos fazer algumas explicitações

    Em primeiro lugar, podemos nos ater ao sentido etimológico da palavra “elucidação”, que é significativa para a compreensão da afirmativa feita.

   A palavra elucidar tem sua origem no latim. Ela é composta pelo prefixo reforçativo “e” e pelo verbo “lucere”, que quer dizer “trazer à luz”. Então, elucidar, do ponto de vista de sua origem vocabular, significa “trazer à luz muito fortemente”, “iluminar com intensidade”. Deste modo, conhecer, entendido como elucidar a realidade, quer dizer uma forma de “iluminar”, de “trazer à luz” a realidade.

    Mas, que luz é essa? Com certeza, não é a luz física, que ilumina e clareia os contornos externos dos objetos. A luz do elucidar tem a ver com incidência da “luz da inteligência” sobre a realidade; tem a ver com inteligibilidacte. O)conhecimento, como elucidação da realidade, é a forma de tornar a realidade inteligível, transparente, clara, cristalina. E o meio pelo qual se descobre a essência das coisas que se manifesta por meio de suas aparências.

    Assim sendo, enquanto a realidade, por meio de suas manifestações aparentes, manifestar-se-ia como misteriosa, impenetrável, opaca, oferecendo resistências ao seu desvendamento (desvendar/des-vendar = tirar a venda) por parte do ser humano, a elucidação seria a sua iluminação, a sua compreensão, o seu desvelamento (desvelar/des-velar = tirar o véu). O ato de conhecer, pois, como ato de elucidar, é o esforço de enfrentar o desafio da realidade, buscando-lhe o sentido, a verdade. Essa realidade tanto pode ser um único objeto, como pode ser uma rede deles formando um todo, mesmo porque nenhum objeto se dá isolado. O que importa, para o conhecimento, é tornar essa realidade compreendida, clara, iluminada.

    No que se refere ao conhecimento, há quatro elementos a serem destacados: um sujeito que conhece; um objeto que é conhecido; um ato de conhecer, e, finalmente, um resultado, que é a compreensão da realidade ou o conhecimento propriamente dito (a explicação produzida e exposta, tornada disponível às pessoas).

    O sujeito, no caso que nos interessa aqui, é o ser humano que construiu a faculdade da inteligibilidade, construiu um interior capaz de apropriar-se simbólica e representativamente do exterior, conseguindo, inclusive, operar de forma abstrata com seus símbolos e representações. O objeto é o mundo exterior ao sujeito, que é representado em seu pensamento a partir da manipulação que executa com eles. Os conceitos não nascem de dentro do sujeito, mais sim da apropriação adequada que ele faz do exterior. Deste modo, a iluminação da realidade não é um ato exclusivo do sujeito, mas um ato que se processa dialeticamente com e a partir da realidade exterior, O sujeito ilumina a realidade com sua inteligência, mas a partir dos fragmentos de “luz”, dos sinais que a própria realidade lhe oferece. O sujeito, no nível da teoria, explica um objeto, não porque ele voluntariamente queira que a explicação seja esta e não outra, mas sim porque os fragmentos da realidade com os quais ele trabalha lhe oferecem uma lógica de compreensão, lhe permitem descobrir uma inteligibilidade entre eles, formando, assim, um conceito que nada mais é do que a expressão pensada de um objeto.

     Além do sujeito e do objeto, no conhecimento, há o ato de conhecer e o resultado desse ato. O ato de conhecer é o processo de interação que o sujeito efetua com o objeto, de tal forma que, por recursos variados, vai tentando captar do objeto a sua lógica, a possibilidade de expressá-lo conceitualmente. Então, o sujeito interage com o objeto para descobrir-lhe, teoricamente, a forma de ser. Por último, o resultado do ato de conhecer é o conceito produzido, o conhecimento propriamente dito, a explicação ou a compreensão estabelecidas, que podem ser expostas e comunicadas. Enquanto o ato de conhecer exige análise dos elementos, dos fragmentos da realidade, enquanto o ato de conhecer é analítico, o conhecimento (a explicação) é sintético. A exposição da explicação obtida não necessita reproduzir, passo por passo, todos os fragmentos do processo de investigação, basta apresentar a lógica central dos dados da realidade que sustentam o conceito formulado.

     Em síntese, o conhecimento é a compreensão/explicação sintética produzida pelo sujeito por meio de um esforço metodológico de análise dos elementos da realidade, desvendando a sua lógica, tornando-a inteligível.

    Se retornarmos agora à resposta, mais ou menos ingênua, que as pessoas dão espontaneamente à pergunta “o que é conhecimento?”, veremos que ela não é, de todo, despropositada. Quando se diz que conhecimento é aquilo que adquirimos nos livros, significa que nos apropriamos dos resultados do processo do conhecer, nos apropriamos da explicação pronta e elaborada. No livro, na exposição, está a elucidação da realidade obtida por alguém e da qual nós também nos apropriamos. Adquirir conhecimento é adquirir uma compreensão da própria realidade. O que ocorre com a aquisição de conhecimentos a partir dos livros, especialmente na experiência escolar, é que ela tem sido normalmente um processo de decorar informações, sem torná-las uma compreensão efetiva da realidade. Saber de cor uma determinada quantidade de informações não significa que se tenha uma determinada compreensão do mundo objetivo.

     Por isso, aquela primeira resposta, em parte, é verdadeira e, em parte, não. Verdadeira, na medida em que aquilo que está exposto, em princípio, é resultado de um ato de conhecer, um conceito formulado; falsa, na medida em que reter informações, pelo processo de memorização, não significa conhecimento, pois que este implica essencialmente compreensão, o que vai além da pura memorização. Além, evidentemente, de que o exposto pode conter uma informação enganosa sobre o real.

     Em síntese, o conhecimento, como elucidação da realidade, decorre de um esforço de investigação, de um esforço para descobrir aquilo que está oculto, que não está compreendido ainda. Só depois de compreendido em seu modo de ser é que um objeto pode ser considerado conhecido.

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